Tenho o privilégio de compartilhar aqui, o breve estudo que realizei a respeito da história e origem do Tai Chi Chuan, uma arte marcial que constrói poder interno, ou seja, baseada na captação e acumulação de energia, usada em benefício do indivíduo que pratica a arte, seja para combate ou principalmente para a saúde mental, espiritual e física.
Quando comecei a estudar sobre a história da Filosofia Chinesa, com um professor Taiwanês, na Tailândia, pude ser introduzida ao Tai Chi Chuan. Este professor é praticante de Tai Chi a mais de 15 anos, e como complemento em nossos estudos, para compreendermos a essência da Filosofia Chinesa, ele convidou todos os alunos para participarmos de aulas práticas de Tai Chi, e foi aí que despertou o meu interesse. Atualmente faço minhas práticas matinais com ele (Chen style), e também com um grupo de 3ª idade de Chineses e Tailandeses num parque perto de casa (Yang style).
Os chineses desenvolveram uma variedade de métodos e técnicas através de sua Filosofia ancestral, permitindo que as pessoas atingissem qualidade de vida, longevidade e saúde. Tai Chi Chuan (ou Taijiquan) é uma delas.
Tai Chi Chuan é uma arte marcial interior, praticada para autodefesa e saúde. É considerada uma “arte marcial interior” porque foca na prática em coletar e acumular energia, para atacar o inimigo com poder e a força interna, possibilitando assim, esforços mínimos em caso de combate.
De acordo com Brecher (1998, p.11,12), existem dois tipos de arte marcial chinesa, a externa (forte, rígida) e a interna (leve, sútil). A arte marcial exterior, como o Karatê e o Kung Fu, consiste em desenvolver o Qi (energia) na região externa do corpo, desenvolvendo força e poder nos músculos, permitindo ao praticante lutar e combater com potência e rigidez. Já a arte marcial interior, como o Tai Chi, consiste em desenvolver e acumular o Qi nos órgãos internos do corpo, permitindo fluidez energética ao longo dos meridianos, alcançando internamente os músculos. A coleta energética torna o praticante sutilmente forte e potente, e em caso de combate, conseguindo vencer a disputa com o mínimo esforço, utilizando apenas a força energética interior que foi acumulada através de sua prática. A prática consiste em concentração no relaxamento, em forma meditativa, de modo a não haver nenhuma restrição no fluxo de Qi. Como resultado, a saúde é preservada e aprimorada. Ao longo da prática da arte marcial interna avançada, o praticante pode tornar seu treino mais intenso e forte, a fim de desenvolver poder e força exterior.
Tai Chi, como arte marcial, emprestou o nome do termo filosófico T’ai Chi (Taiji – 太極), que significa Supreme Ultimate (Grandioso Supremo), compostos por duas palavras chinesas: tai (太) – grandioso, supremo, imponente, extremo e ji (極) – polo, cume, cobertura, o mais alto ponto, extremo, alcançar o fim, atingir o topo.
Na Filosofia Chinesa, de acordo com Cheng Man Ch’ing (1985, p.21) T’ai Chi, o Grandioso Supremo é a mãe do Yin-Yang:
“Não há nada que não contenha. Deste primordial ponto de vista do T’ai Chi, veio o nome da arte marcial interior, Tai Chi. O Livro das Mutações (I Ching Book), diz que o T’ai Chi dá à luz ao Liang I (dois poderes primordiais), Yin e Yang. O extremo yin produz yang, e o extremo yang produz yin. Na alternância do robusto e sútil, do movimento e quietude, cada força é aplicada ao seu limite”.
A prática de Tai Chi Chuan segue o princípio (filosófico) do T’ai Chi, que é sutil e oculto, criando uma prática misteriosa: “Tai Chi Chuan não destrói apenas dureza e rigidez, a prática pode também controlar movimentos. Ajuda o fraco a se tornar forte, o doente a se curar e o tímido a se tornar corajoso. A prática fortalece o corpo, a nação e o país” (Cheng Man Ch’ing, 1985, p.23).
Breve história do Tai Chi Chuan
Tai Chi Chuan, uma arte marcial ancestral chinesa, com alguns séculos ou milênios de existência. Não é sabido a verdadeira origem ou a época quando especificamente o Tai Chi passou a existir, o que se sabe são diferentes histórias e lendas contadas sobre a linda arte marcial chinesa.
Atualmente existem variados estilos de Tai Chi, como Chen (陳家), Yang (楊氏), Wu (吳氏), Wu (Hao – 武氏), Sun (孙氏) … Porém, todos eles traçam sua origem histórica, ao vilarejo chamado Chen.
Existem duas teorias a respeito da origem do Tai Chi:

“A primeira lenda é que o eremita Chang San-Feng, da Montanha Wu-tang, inventou o Tai Chi no fim da dinastia Yuan e início da dinastia Ming (1367 – 1403 d.C.). Alguns, porém, duvidam da existência de Chang San-Feng. Outras teorias afirmam que o Tai Chi foi primeiramente criado por Chen Wang-ting no final da dinastia Ming e início da Ch’ing (1628 – 1736 d.C.), ele foi o fundador da família Chen to Tai Chi”. (Lo/Inn/Amacker/Foe, 1979 p.13)

A história sobre a família Chen é a mais coerente a respeito da origem do Tai Chi, “desenvolvido por Chen Wang-ting (1678-1736) no vilarejo da família Chen. É dito que Chen Wang-ting aprendeu Tai Chi com Jiang Fa, que aprendeu de Chang San-Feng. Alternadamente, alguns estudiosos afirmam que Chen Wang-ting é o verdadeiro e único criador do Tai Chi Chuan, ao invés de Chang San-Feng.” (Chia & Jan, 2010 p.6). É muito complicado e muitas vezes contraditório traçar a história do Tai Chi e descobrir exatamente o antepassado da arte ancestral, porém, o que se sabe é que a modalidade Chen foi a primeira, e é considerada a origem de todas as outras modalidades – Yang, Wu, Wu (Hao) e Sun.
O estilo Yang, foi criado por Yang Lu-Shan (1799-1872), que foi estudante de Chen Chang-Xing (1771-1853). “Depois de estudar com Chen, ele mudou-se para Pequim e envolveu-se com diversos tipos de artes marciais, recebendo o nome de “Yang No Equal”, que quer dizer, “Yang, sem igual”. O estilo Wu também foi influenciado pela modalidade Chen, Wu Yu-hsiang (1812-1880), foi estudante de Chen Chin-ping da mesma origem Chen. (Lo/Inn/Amacker/Foe, 1979 p.14)
A modalidade mais conhecida no mundo é a Yang, porque “Yang Lu-Shan, disseminou o conhecimento para fora da comunidade e permitiu que estudantes estrangeiros aprendessem a prática. Os filhos de Yang, Pan-hou (1837-1892) e Chien-hou (1839-1917) também foram excelentes mestres, e ajudaram a disseminar o conhecimento a respeito do Tai Chi pela China, seguidos pelos estudantes, que espalharam a prática e a filosofia severamente, até alcançar todos os cantos do mundo.

De acordo com o Professor Li Deyin, um dos mestres mais respeitados na China, num congresso sobre Tai Chi Chuan em novembro de 2015 em Bangkok, diferentes dialetos da antiga China, impediram a comunicação entre os chineses durante um longo período, até o Mandarim passar a ser a língua oficial do país. O mesmo aconteceu com o Tai Chi, os diferentes estilos fizeram com que a interação entre os praticantes fosse difícil e complicada, até aproximadamente 50 anos atrás, quando a padronização do modelo de 24 movimentos da modalidade Yang passou a existir. Atualmente, pessoas de toda a parte do mundo interagem e executam juntos a mesma prática, permitindo assim, uma comunicação corporal e energética entre os praticantes, independente de língua, raça, cor ou cultura.
Professor Li Deyin, também enfatizou que os diferentes estilos contemporâneos do Tai Chi fazem com que a prática seja adaptada a todos os tipos de pessoas, permitindo que todos possam ter condição de praticar e se conectar com a arte marcial ancestral, respeitando a limitação do indivíduo, pois nem todos os movimentos são indicados a determinado tipo de pessoa. A essência do Tai Chi é buscar longevidade e saúde, e não especificamente o combate. De acordo com o professor, para combate o Kung Fu é a arte marcial indicada. Ele citou o exemplo do Bruce Lee, que morreu muito jovem. Tai Chi é uma arte marcial introspectiva, que busca pela saúde mental, espiritual e física do indivíduo, permitindo bem-estar e longevidade.
Assista a apresentação de Tai Chi Chuan (Yang style) realizada no evento de Tai Chi que aconteceu em novembro de 2015 em Bangkok.
Referências:
Brecher, Paul. (1998). The Way of the Spiritual Warrior. Soft Style Martial Arts for Body, Mind, & Spirit. New York: Godsfield Press.
Cheng Man Ch’ing. (1985). Cheng Tzu’s Thirteen Treatises of T’ai Chi Ch’uan. Benjamin Pang Jen Lo and Martin Inn. (Trans.). California: Blue Snakes Books.
Chia, Mantak & Jan, Andrew. (2010) Tai Chi Fa Jin – Advanced Techniques for Discharging Chi Energy. Toronto: Destiny Books.
Fung, Yu-Lan. (1966). A Short History of Chinese Philosophy. (ed. Derk Boddee). New York: Macmillan.
Li Deyin. International Conference about Tai Chi Chuan. Wennie Wang (Trans.). Bangkok 27/11/2015
Lo, Benjamin Pang Jen / Inn, Martin / Foe, Susan / Amacker, Robert. (1979). The Essence of T’ai Chi Ch’uan. The Literary Tradition. Benjamin Pang Jen Lo (Trans.). California: Blue Snakes Books
Oi Bárbara, gostaria de acrescentar alguns detalhes. Chen Wang Ting não aprendeu de Jian Fa que por sua vez não aprendeu com Chan San Feng. O estilo que vc pratica, se é o mesmo descendente de Chen Wang Ting, não tem g no final. A grafia é Chen.
Chen Wang Ting foi o criador do Taijiquan da família Chen, origem de todos os estilos atuais de Taijiquan. No resto, seu artigo está correto. Abs.Estevam Ribeiro
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Olá Estevam! Gratidão pelo seu comentário e feedback. Realmente foi um erro de digitação “Cheng”, o nome da modalidade é CHEN e já corrigi.
Quanto a citação sobre Chen Wang-Ting ter aprendido de Jian Fa, que por sua vez aprendeu de Chan San Feng, esta não é uma citação minha, e sim de um livro que li a respeito do Tai Chi Chuan.
Referência: Chia, Mantak & Jan, Andrew. (2010) Tai Chi Fa Jin – Advanced Techniques for Discharging Chi Energy. Toronto: Destiny Books.
A referência encontra-se na página 6, onde diz: “Chen Wang-Ting is said to have learned Tai Chi from Jiang Fa, who had learned it from Chang San-Feng. Alternatively, some scholars believe that Chen Wang-Ting was the true creator of Tai Chi Chuan, rather than Chang San-Feng.”
Como deve saber, existem diversas histórias, contos e lendas a respeito da origem do Tai Chi, e pelas palavras do Mestre Li-Deyin, com quem tive o privilégio de aprender sobre a história, “devemos ter bom senso e aprender a aceitar as diferentes versões sobre a origem do Tai Chi, o que mais importa para nós hoje, é termos a oportunidade de desfrutar dessa arte que é tão mágica e importante para nossa saúde física, mental e espiritual!”
Mesmo assim, agradeço sua atenção por ler o artigo e compartilhar sua opinião!
Um grande abraço!
Paz e Luz
Profa. Barbara Santos
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